HISTÓRIA VERDADEIRA
Após ter terminado a instrução primária, nos anos cinquenta, sou enviado pelo meu tutor para o Baixo Alentejo, como caixeiro, para a linda vila do Cercal do Alentejo, onde além de outras tarefas inerentes à atividade que ia desenvolver tinha também a tarefa de « ir dar de comer ao cão» que existia na retaguarda da casa.
O cão era
branco, de tamanho médio e malhado de amarelo; Encontrava-se preso, pela
coleira, a um arame com cerca de dez metros que se encontrava fixado na parede que servia de suporte a outro barracão onde era guardada a
lenha e a um anexo onde ficavam as pocilgas dos suínos.
Tinha o seu comedouro e aí ia passando os dias cumprindo a sua função de guarda, até que um dia apareci eu que, para me ver livre da tarefa de lhe dar de comer, engendrei o esquema que hoje me arrependo.
Tinha o seu comedouro e aí ia passando os dias cumprindo a sua função de guarda, até que um dia apareci eu que, para me ver livre da tarefa de lhe dar de comer, engendrei o esquema que hoje me arrependo.
Assim, comecei diariamente a atazanar o bicho, melhor a
atenazar, porque o metido consistia em colocar as falanginhas e as falangetas
da mão direita dos dedos indicador e médio de modo que ao abrir, os dedos nesta
posição, para o lado, ficava na presença de uma autêntica tenaz.
Depois, lentamente, quando podia, ia-lhe apertando o nariz até o cão começar a ganir e
depois soltava como fazem os mecânicos quando estão a afinar um carburador«risos». Esta malvadez ia-a eu fazendo quase diariamente até que o cão a
pouco e pouco foi-se, com razão, enchendo de ódio a tal ponto que bastava eu,
sem contacto físico, fazer o gesto e assoprar «vvvvvv» para que este quase partisse o arame ou a
coleira para se vingar.
A partir daqui resolvi o problema de não ir dar de
comer ao cão, com o argumento de ter medo do mesmo, mas como «o cântaro tantas
vezes vai à fonte que um dia lá fica a asa» e, o que eu pensava ser impossível
de acontecer, aconteceu.
E, um belo dia,
quando eu estava a fazer o gesto da tenaz a cerca de vinte metros do «bicho» e,
estando este, no início do extremo oposto do arame, desata a correr na minha
direcção, partindo a coleira; dizem que os cães são daltónicos, mas ele viu-me
bem.
O armazém tinha uma meia porta pequena por onde mal passava
uma pessoa de pé? Não me restou outra alternativa« Ó pernas para que te quero». Desato a correr passo pelo meio da porta e atravesso a rua e vou-me abrigar na
casa de banho da oficina de sapateiros existente a cinquenta metros do início
da corrida, mas do outro lado da rua. Tivemos sorte ,eu e o cão, porque não
passou nenhum veículo naquela altura. Lá, de dentro da casa de banho, ouvia cá fora as unhas do
bicho a riscar a porta.
Então eu não vos digo o que aconteceu………. Mas foi isso
mesmo que estão a pensar. Devo à Maria que apareceu em meu auxílio, levando o «bicho» e trazendo roupa limpa para eu mudar.
Digo-vos que nunca vi o cão, mas
ouvi as suas patas a riscar a porta do meu “resort”. Como tinha “ livre-trânsito” na
cozinha, o cão depressa me desculpou, porque passei a tratá-lo com humanismo.
Diz-se que o cão, pela sua fidelidade, é um dos melhores amigos do
homem, mas há imperativos de ordem moral que vivi que contrariam esta
expressão. Para esta ser assertiva tem que levar mais «se forem tratados com
humanismo», o que não foi o caso. Depressa compreendi o erro e, logo, me
arrependi. Aprendi a lição.
MORAL DA HISTÓRIA
Eu era novo, podia fugir e tive uma mão amiga
e um sítio para me esconder. Agora pensem o que pode acontecer quando todos os
cães atacarem ao mesmo tempo. Haverá casas de banho para todos aqueles que de
humanismo nada têm? Fica a questão.
Espero que gostem e comentem.
Publicado por:
Imagens do Álbum do Autor e do Google
abibliotecaviva.blogspot.pt
Fevereiro de 2011
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